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Piracicaba – O Vale do Silício Caipira

Por: Leandro De Almeida

17/03/2023 - Atualizado em 17 de março de 2023

A humanidade é fascinada pelos contrastes. Pelos contrapontos.

Em algum lugar da nossa mente há conjuntos de neurônios teimosos especializados em unir partículas semânticas que, à primeira vista, não foram feitas umas para as outras. E dessas conexões resultam combinações fascinantes que nos presenteiam com elementos da poesia, do humor, e com ideias que são o start do nosso trajeto como seres da ciência e da tecnologia: o novo está justamente na união de elementos que até então não tinham tido a oportunidade de se encontrar.

É desta maneira que uma imagem muito peculiar se forma em nossa mente quando se pensa na denominação “Vale do Silício Caipira”. A referência à região que abriga grandes empresas de tecnologia e startups nos EUA unida à figura que temos como padrão do significado de “caipira” faz cócegas em nossa mente. E o sorriso que isso provoca é, neste momento, razão de comemoração, pois Piracicaba vai muito bem na tarefa de se destacar e agir na descentralização do movimento tecnológico no Brasil, antes restrito à capital.

A concentração de startups na cidade também a faz ser conhecida como a Agtech Valley, (O Vale das Agtechs), uma designação inspirada na alta concentração de iniciativas relacionadas à tecnologia dedicada ao agronegócio.

Saiba mais sobre as Agtechs aqui.

Segundo Eduardo Soriano, desenvolvedor de negócios da WBGI -  venture builder que fomenta a criação de startups - este conglomerado tem feito muito bem aos negócios dos arredores:

“Entendo que quando você tem uma concentração de empresas ou startups em uma mesma região, desde que estas estejam dentro de um mesmo mercado de atuação, ou seja, agronegócios, médico-hospitalar, metal mecânico etc.,  a concentração pode gerar uma força de atuação muito importante dentro da região, ou ainda, elevar o nível de comercialização entre elas, pois havendo concentração, a concorrência aumenta e consequentemente novas ideias e melhores produtos surgem, condição básica para a cultura da inovação se apresentar.”

Talvez esta fala concentre muito das razões que inspiram essa qualificação. O fato de haver uma concentração de esforços associados ao agronegócio numa cidade do interior paulista é o que confere o status de caipira a este vale. E isto se coloca de forma alegórica e poética. Não como um carimbo de limitação e estagnação. Não como uma visão simplista que o termo poderia ter a princípio.

Precisamos desse título?

Graças ao simpático apelido, Piracicaba tem mais uma vez reconhecida sua relevância como polo tecnológico e educacional. A cidade é famosa devido à quantidade de startups que nasceram, se desenvolveram ou se mudaram para a região; às empresas de grande porte em setores diversos e à presença de universidades de peso como USP e Unicamp.

Diante do status consolidado em relação ao seu papel como promotora e desenvolvedora de tecnologia, e dos resultados vindos da união entre academia, setor privado e Estado, surge a pergunta: a cidade realmente precisa deste “selo”, desta “certificação”?

A resposta é: Sim..

Os títulos têm importância. Neste caso, os epítetos.

Assim como acontece com “Alexandre, o grande”, e “Ivan, o terrível” – apenas citando os mais populares, estes complementos atestam características e impõem identidade às denominações.

A cidade tem prazer em carregar esses termos contrastantes e age constantemente para a valorização de ambos.

Inovar é dizer não à limitação

É muito provável que a imagem do caipira paulista esteja muito associada a uma figura literária criada por Monteiro Lobato na primeira parte do século XX.

Jeca Tatu, homem de hábitos extremamente simples e alheio ao que o mundo tem a oferecer é a representação imagética de um conceito limitado e pejorativo que precisa ser revisto.

Criado como uma crítica ao desinteresse dos poderes públicos da época em relação à população rural e inspirado nas dificuldades dessas pessoas no que se refere ao acesso à saúde e informação, Jeca Tatu inclusive é, segundo o próprio Lobato, uma situação e não uma existência: “O Jeca Tatu não é assim. Ele está assim.”

Em determinados momentos do passado as cidades do interior paulista, como Piracicaba, estiveram em pauta por conta de suas particularidades culturais e linguísticas. E estas características são um adereço dos quais a região não precisa abrir mão para se inserir no mundo moderno. O seu lado caipira apenas é um reforço que garante um tom genuíno à cidade e às iniciativas nela desenvolvidas.  Trata-se de uma soma.

“Os caipiras” e “as caipiras” deste vale têm acesso ao que há de mais inovador e tecnológico. E quando não o encontram à disposição, eles estão prontos para criar um meio de fazer esta tecnologia existir interferindo diretamente num ecossistema que dá novos ares a diversas cadeias produtivas.

O Pecege tem um laço muito estreito com esta denominação

A tecnologia está nas veias do Pecege: trata-se de um instituto dedicado à educação e à inovação; e nasceu na cidade de Piracicaba.

É uma iniciativa nascida na ESALQ, campus da USP considerado um dos maiores centros acadêmicos dedicados ao setor agrícola no mundo.

Embora a natureza das atividades desenvolvidas no Pecege seja bastante ampla, muito do que aqui é produzido enquanto ferramentas e soluções está ligado ao Agronegócio. Principalmente se enxergarmos este setor na amplitude que ele tem enquanto cadeia produtiva que engloba gestão, finanças, logística e pesquisa, por exemplo.

O Pecege sem dúvida faz parte deste movimento tão positivo da valorização de contrastes e atua diretamente no fortalecimento dos pontos através do fomento à pesquisa, disseminação do conhecimento e o aprimoramento da mão de obra de ponta.

E tem orgulho de ser, também, parte deste vasto horizonte caipira.